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domingo, 2 de março de 2014

Da carnaúba



Não faz muito tempo andei lamentando o atraso na discussão e possível adoção da carnaubeira como a árvore-símbolo do Rio Grande do Norte, ideia lançada por Diógenes da Cunha Lima. E por uma razão simples: era tarde. O Ceará, em março de 2004, no Governo Lúcio Alcântara, já adotara através de decreto, com livro documentando sua história e suas imagens. Como Pernambuco tombou como patrimônio imaterial a tapioca muito antes de nós, com nossa cultura de eventos, estéril e inútil.

E olhe Senhor Redator, que a importância da carnaúba, com registro de viajantes nos séculos dezessete e dezoito, nos foi informada por Câmara Cascudo ainda em junho de 1964, quando publicou seu ensaio ‘A Carnaúba’, no número 2 do ano XXVI, abril-junho, da Revista Brasileira de Geografia do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE. O texto teve ainda duas edições em fac-símile, pela Coleção Mossoroense, 1991 e 1998, esta na tiragem que homenageou o centenário do seu autor.

Cascudo teve a ousadia de contestar Alexandre Von Humboldt quando viu a palmeira murici e imaginou ter os olhos numa carnaubeira. O erro teria levado Ferdinand Denis a citar a frase famosa de Humboldt classificando de a árvore da vida, quando Humboldt, insiste Cascudo, seguindo seus rastros no Brasil colonial, ‘nunca chegou a ver uma carnaúba em dias de sua vida’. Assim como é errado, ele afirma ainda, considerar ‘carandá’ e ‘carandazal’ ‘significando o mesmo que carnaúba e carnaubal’.

Agora, embora a motivação seja bem outra, o Idema, instituto estatal que cuida da preservação do meio ambiente, promove discussões em consultas públicas nos vários municípios – Carnaubais, Pendências, Assu, Aldo do Rodrigues e Afonso Bezerra – que formariam a região natural para abrigar uma Área de Proteção Ambiental – APA – das carnaúbas. Quem sabe, salva o que ainda sobrevive dos velhos carnaubais que no passado foram a sobrevivência e a lírica inspiração dos seus velhos poetas.

Nossa consciência coletiva ainda parece muito frágil e carente de um processo civilizatório consistente, e a ausência de uma educação formadora da cultura como o acúmulo de conhecimentos e experiências. Assim, a preservação ambiental sofre a incompreensão dos que julgam um atraso manter o patrimônio silvestre numa terra que precisa ser economicamente explorada, como se essa exploração não pudesse acontecer de forma racional e sustentável, sem a devastação do progresso desordenado.

Que venha, pois, a Área de Proteção Ambiental, mas que venha bem vestida do saber que a carnaúba representa e exige. Não apenas como um símbolo nativo, mas preservando a sua história que faz parte da própria vida das populações da região banhada pelos seus rios formadores do seu vale e de sua paisagem singular. Já que a perdemos como árvore-símbolo, mesmo sendo do Rio Grande do Norte seu ousado estudioso, aquele que há sessenta anos mergulhou os olhos no leque de suas folhas.