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terça-feira, 23 de julho de 2019

Advogado entra na Justiça contra som de carrinhos de picolé nas ruas de Natal



Exploração de atividade comercial através do direito à livre circulação contra a alegação de perturbação do sossego alheio. 

Essa foi uma questão que a Justiça do RN teve que resolver. 

De um lado, uma empresa que vende seus produtos nas ruas da capital, anunciando os picolés com carrinhos de som. De outro, um advogado incomodado com o barulho que é produzido.

A disputa superou a esfera cotidiana e bateu à porta do Judiciário, sendo decidida, em segunda instância pelos desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça. Com a unanimidade de votos, a empresa saiu vencedora.

O caso chegou ao Judiciário por um advogado que alegou que vem sofrendo graves transtornos e aborrecimentos por causa do de "ruído exagerado" ocasionado por vendedores da empresa ao conduzirem carrinhos de som, para venda dos produtos, em frente a sua residência, no Barro Vermelho, na Zona Leste de Natal.

Ainda de acordo com ele, o barulho era acima dos padrões estabelecidos, de modo que a sua integridade psíquica e o seu sossego vinham sendo ofendidas com frequência, várias vezes ao dia durante a semana, inclusive aos sábados e domingo, nos horários de repouso, entre 12h e 14h.

Já a empresa afirmou à Justiça que os carrinhos passam esporadicamente e no horário comercial, anunciando os produtos sem exagero e em intensidade sonora menor que outros ruídos da rua. Apontou ainda que para até 45 decibéis são ruídos toleráveis para área residencial conforme resoluções federais. Além disso, alegou que não existia prova técnica que atestasse a poluição sonora, e atacou o pedido de indenização por danos morais, pedindo pela improcedência da ação.

Na primeira instância, o Juízo da 8ª Vara Cível de Natal julgou improcedentes os pedidos formulados à petição inicial. Na ocasião, a julgadora entendeu que os atos da vida cotidiana, os contratempos e desventuras corriqueiras não estão abrangidos pela responsabilidade civil e que a prova a indicar que os ruídos ultrapassam o limite do que é razoável simplesmente não foi produzida.

A magistrada alegou, na análise dos autos, que o que se tentou combater com a ação foi o trânsito de carrinhos de picolés da empresa pela rua do autor e circunvizinhas, por causa do barulho produzido quando circulam, o que certamente, no seu entendimento, não caracteriza dano moral, impondo-se a total improcedência da demanda judicial.

Apelação


O advogado, então, recorreu ao Tribunal de Justiça, afirmando que “não há pedido na inicial para que se impeça a livre circulação de pessoas em via pública”, de forma que a fundamentação constante na sentença, nesse sentido, é exorbitante. Denunciou que a magistrada “praticamente advoga em favor da parte ré quando apenas considera o ônus do autor em provar o alegado”.

Ele ainda sustentou no recurso que o dano se caracteriza pela perturbação ao sossego decorrente de atividade comercial exercida em desconformidade com as normas legais e que é cabível a indenização em danos morais.

Porém, o relator da Apelação Cível no TJRN, desembargador Cornélio Alves, entendeu que sendo a inversão do ônus probatório medida excepcional e inexistindo qualquer dificuldade ou impossibilidade do autor demonstrar o que alega nos autos, é incabível sua concessão.

De acordo com o relator, no caso, não se pode deixar de reconhecer que o eventual barulho emitido pela caixa de som dos carrinhos de picolé da empresa apenas transitam pela rua do autor, sem realizar parada, de forma que é muito rápido o momento em que passam por sua residência, sendo desarrazoada a reclamação de emissão de ruídos insuportáveis.

“Nesse diapasão, é natural a produção de sons da rua ocasionado por vários fatores, tais como movimento de pessoas, motocicletas e carros circulando, o que, por óbvio, não pode ser obstado pelo simples desconforto que isso pode gerar em alguém”, considerou, não renovando a proibição de circulação concedida liminarmente.

No pensar do julgador, impedir que o revendedor da empresa trafegue pela rua do autor oferecendo seus produtos através de alto-falante, seria obstaculizar seu direito de livre acesso onde quer que queira circular, vez que, em tese, a simples utilização de som não afronta qualquer disposição legal.

“Assim, ocupar o Judiciário com causa de pequena complexidade, que se pode resolver de forma pacífica através do diálogo, fazendo uso do bom senso, ocasiona retardo enorme na prestação jurisdicional e, consequentemente, a insatisfação dos que buscam à justiça a procura de solução de litígios que verdadeiramente necessitam da intervenção do Estado-Juiz”, assinalou o relator, negando a indenização por eventual perturbação ao sossego alegada.