Por
Vicente Serejo
Não faz muito tempo andei lamentando o atraso na
discussão e possível adoção da carnaubeira como a árvore-símbolo do Rio Grande
do Norte, ideia lançada por Diógenes da Cunha Lima. E por uma razão simples:
era tarde. O Ceará, em março de 2004, no Governo Lúcio Alcântara, já adotara
através de decreto, com livro documentando sua história e suas imagens. Como
Pernambuco tombou como patrimônio imaterial a tapioca muito antes de nós, com
nossa cultura de eventos, estéril e inútil.
E olhe Senhor Redator, que a importância da
carnaúba, com registro de viajantes nos séculos dezessete e dezoito, nos foi
informada por Câmara Cascudo ainda em junho de 1964, quando publicou seu ensaio
‘A Carnaúba’, no número 2 do ano XXVI, abril-junho, da Revista Brasileira de
Geografia do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE. O texto
teve ainda duas edições em fac-símile, pela Coleção Mossoroense, 1991 e 1998,
esta na tiragem que homenageou o centenário do seu autor.
Cascudo teve a ousadia de contestar Alexandre Von
Humboldt quando viu a palmeira murici e imaginou ter os olhos numa carnaubeira.
O erro teria levado Ferdinand Denis a citar a frase famosa de Humboldt
classificando de a árvore da vida, quando Humboldt, insiste Cascudo, seguindo
seus rastros no Brasil colonial, ‘nunca chegou a ver uma carnaúba em dias de
sua vida’. Assim como é errado, ele afirma ainda, considerar ‘carandá’ e
‘carandazal’ ‘significando o mesmo que carnaúba e carnaubal’.
Agora, embora a motivação seja bem outra, o Idema,
instituto estatal que cuida da preservação do meio ambiente, promove discussões
em consultas públicas nos vários municípios – Carnaubais, Pendências, Assu,
Aldo do Rodrigues e Afonso Bezerra – que formariam a região natural para
abrigar uma Área de Proteção Ambiental – APA – das carnaúbas. Quem sabe, salva
o que ainda sobrevive dos velhos carnaubais que no passado foram a
sobrevivência e a lírica inspiração dos seus velhos poetas.
Nossa consciência coletiva ainda parece muito
frágil e carente de um processo civilizatório consistente, e a ausência de uma
educação formadora da cultura como o acúmulo de conhecimentos e experiências.
Assim, a preservação ambiental sofre a incompreensão dos que julgam um atraso
manter o patrimônio silvestre numa terra que precisa ser economicamente explorada,
como se essa exploração não pudesse acontecer de forma racional e sustentável,
sem a devastação do progresso desordenado.
Que venha, pois, a Área de Proteção Ambiental, mas
que venha bem vestida do saber que a carnaúba representa e exige. Não apenas
como um símbolo nativo, mas preservando a sua história que faz parte da própria
vida das populações da região banhada pelos seus rios formadores do seu vale e
de sua paisagem singular. Já que a perdemos como árvore-símbolo, mesmo sendo do
Rio Grande do Norte seu ousado estudioso, aquele que há sessenta anos mergulhou
os olhos no leque de suas folhas.
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