Em 1918, gripe espanhola espalhou morte e pânico


Parece filme de terror. Cadáveres jazem na porta das casas, atraindo urubus. O ar é fétido. Os raros transeuntes andam a passos ligeiros, como se fugissem da misteriosa doença. Carroças surgem de tempos em tempos para, sem cuidado ou deferência, recolher os corpos, que seguem em pilhas para o cemitério.

Como os coveiros, em grande parte, estão acamados ou morreram, a polícia sai às ruas capturando os homens mais robustos, que são forçados a abrir covas e sepultar os cadáveres. Os mortos são tantos que não há caixões suficientes, os corpos são despejados em valas coletivas e o trabalho se estende pela madrugada adentro.

O filme de terror ocorreu em 1918, quando a gripe espanhola invadiu o Brasil A violenta mutação do vírus da gripe veio a bordo do navio Demerara, procedente da Europa. Em setembro desse ano, sem saber que trazia o vírus, o transatlântico desembarcou passageiros infectados no Recife, em Salvador e no Rio de Janeiro.

No mês seguinte, o país inteiro já está submerso naquela que até hoje é a mais devastadora epidemia da sua história.

A gripe espanhola, como indicam os discursos acima, domina os debates do Congresso Nacional. As falas dos parlamentares integram o acervo histórico do Arquivo do Senado e do Arquivo da Câmara, em Brasília, e mostram como o Brasil de 1918 se comportou diante da doença.

Todas as classes, desde os humildes trabalhadores até aqueles que gozam do maior conforto na vida, foram alcançados pelo flagelo terrível, que bem parece universal.

Nem mesmo o presidente da República é poupado. Rodrigues Alves, eleito em março de 1918 para o segundo mandato, cai de cama “espanholado” e não toma posse. O vice, Delfim Moreira, assume interinamente em novembro, à espera da cura do titular. Rodrigues Alves, porém, morre em janeiro de 1919, e uma eleição fora de época é convocada.

De forma indireta, a gripe espanhola planta tanto a semente do Ministério da Saúde, que surgirá em 1930 (como Ministério dos Negócios da Saúde e da Educação Pública), quanto a do Sistema Único de Saúde (SUS), que será previsto na Constituição de 1988.

Do mesmo modo abrupto com que chega ao Brasil, a gripe espanhola desaparece repentinamente. Em dezembro, já são raros os contágios. Foram tantas as pessoas infectadas entre setembro e novembro que o vírus praticamente não tem mais a quem atacar.

A reportagem publicada originalmente AQUI.

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